Quando o pastor é dispensado . . . (parte 2)

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Na semana passada iniciamos a reflexão sobre como um pastor deve responder quando dispensado pela liderança local. Naquela ocasião consideramos algumas respostas comuns e outras que deveriam ser evitadas por esse obreiro. Nessa semana, por meio de conselhos, consideramos as respostas que devem ser cultivadas quando somos tomados pela surpresa da dispensa.

 

  1. Respostas a serem cultivadas

Ainda que não sejam fáceis, nem brotem espontaneamente do coração aflito, há algumas maneiras de responder à dispensa que glorificam a Deus, edificam o rebanho e trazem refrigério à nossa alma angustiada. Como não se trata de reações naturais do nosso coração quebrado, essas atitudes necessitam ser cultivadas e intencionalmente praticadas.

Na tentativa de corrigir as reações negativas anteriormente mencionadas, descrevo abaixo cinco atitudes corretas de se responder aos momentos em que nos sentimos rejeitados. O objetivo de se cultivar essas ações é glorificar a Deus e manter a sanidade necessária para continuar amando aqueles por quem nos sentimos dispensados.

  1. Guarde o seu coração. Qualquer pastor biblicamente orientado sabe da importância que as Escrituras dão ao coração humano. Jesus o comparou a uma “casa do tesouro” ou a um baú, do qual se tiram coisas boas e más (cf. Lc 6.45). O escritor de Provérbios afirmou que “dele procedem as fontes da vida” (cf. Pv 4.23). Mas o sofrimento nos torna pessoas vulneráveis e facilmente influenciadas pelas inclinações negativas do nosso coração. Nesses momentos, a tendência do nosso coração é acumular ira, amargura, sentimento de injustiça, desejo de vingança e tantas outras coisas que podem ser destrutivas ao nosso vigor espiritual. Por isso, é necessário guardar nosso coração!

Nesse processo de cuidado íntimo, é importante notar que a responsabilidade da guarda do coração é pessoal e individual. Ninguém pode fazê-lo por nós! O pastor que sente a dor de ter sido dispensado deve colocar guardas sobre seu coração para que, mesmo em meio à aflição, ele continue expressando os elementos do fruto do Espírito, ou seja, amor, alegria, paz, bondade e todas as outras virtudes mencionadas na Bíblia (cf. Gl 5.22-23). O melhor de tudo é saber que, a despeito de nossas fraquezas, o ensinamento de Paulo sobre o fruto do Espírito é que o Senhor já nos capacitou para expressá-lo em nossa caminhada com o Mestre.

  1. Pastoreie sua família. Em casos de dispensa não é somente o pastor que é afetado; sua família também sofre. Afinal, todos, de alguma maneira, vivem do ministério, se mudam pelo ministério e tomam decisões em função da dedicação ministerial do obreiro. Por isso, é comum que a família do pastor também lute contra sentimentos de injustiça, frustração, desencorajamento e amargura. Nessas horas, além de guardar seu próprio coração, o ministro ainda deve pastorear, de maneira especial, os de sua própria casa.

Há inúmeros casos em que um(a) filho(a) ou esposa de pastor demonstram o amar a Deus, mas dizem nutrir reservas contra a igreja por causa de algum tratamento ofensivo ao ministro. No entanto, o próprio pastor pode ajudar nesse sentido, ensinando os membros de sua família a distinguir entre ações e pessoas. Ações podem ser erradas, reprovadas e lamentadas, mas pessoas precisam ser amadas e cuidadas, mesmo quando agem errado. Ao pastorear sua família, o ministro contribui para que eles cresçam, mesmo em situações adversas.

  1. Aprenda a depender de Deus em oração. O salmista afirma que “ao homem que teme ao Senhor, ele o instruirá no caminho que deve escolher” (Sl 25.12). Essa promessa de orientação divina é um convite para que o devoto derrame seu coração perante o Senhor e dependa dele. Esse processo de intimidade com Deus é extremamente benéfico para o ministro e a todos ao seu redor. Com frequência crescemos mais nos momentos de dor e aridez do que naqueles de triunfos e celebrações. Isso se torna claro quando se considera a experiência do salmista que orou a Deus, dizendo: “Foi-me bom ter eu passado pela aflição, para que aprendesse os teus decretos” (Sl 119.71).

Esse aprendizado nos momentos de incerteza e confusão acabam desenvolvendo em nós virtudes que expressam maturidade espiritual. Certamente por essa razão Tiago descreveu esse processo da seguinte maneira: “Meus irmãos, tende por motivo de toda alegria o passardes por várias provações, sabendo que a provação da vossa fé, uma vez confirmada, produz perseverança. Ora, a perseverança deve ter ação completa, para que sejais perfeitos e íntegros, em nada deficientes” (Tg 1.2-4). Portanto, o fim de uma aflição causada pela dispensa pode ser benéfico, se aprendermos corretamente.

  1. Continue pastoreando como alguém que serve ao Supremo Pastor. A motivação para a alegria no pastoreio não deve estar fundamentada na resposta das pessoas ao trabalho do ministro. Se fosse assim, Isaías nunca teria experimentado qualquer júbilo em seu ministério, pois o chamado de Deus para ele incluía a seguinte instrução: “[…] Vai e dize a este povo: Ouvi, ouvi e não entendais; vede, vede, mas não percebais. Torna insensível o coração deste povo, endurece-lhe os ouvidos e fecha-lhe os olhos, para que não venha ele a ver com os olhos, a ouvir com os ouvidos e a entender com o coração, e se converta, e seja salvo” (Is 6.9-10). Além do mais, o apóstolo Paulo afirma que “o que se requer dos despenseiros é que cada um deles seja encontrado fiel” (1Co 4.2). Logo, fidelidade – e não popularidade – é o que deveria ser perseguido pelo obreiro dedicado.

A vocação ao ministério pastoral só pode ser corretamente exercida se o alvo do obreiro for satisfazer ao Supremo Pastor. Isso foi lembrado por Paulo a Timóteo em uma condição que aquele jovem pastor se sentia enfraquecido e não gozava da aprovação de todos na igreja onde servia (cf. 2Tm 2.1-7). Logo, essa verdade necessita ser ponderada e colocada em prática para que o ministério tenha sua continuidade, mesmo quando o obreiro recebeu a notícia de sua dispensa.

  1. Estabeleça um plano proativo de ações futuras. Os próximos passos após a notícia da dispensa são fundamentais. Nesse sentido, estabelecer contatos com pastores amigos à procura de algum outro campo onde nossos talentos sejam úteis é totalmente apropriado. Também, colocar-se à disposição para servir no campo missionário ou alguma outra área da denominação são atitudes lícitas de alguém ávido a servir. O inapropriado, nessas ocasiões, são as manipulações políticas e tramas desonestas. Enfim, ser dispensado por uma igreja não implica, necessariamente, estar desqualificado para o exercício do ministério em outra localidade. Logo, um plano proativo é extremamente útil nesses momentos.

Outra maneira de agir proativamente é procurar corrigir alguns erros, falhas e abordagens que contribuíram com a deterioração do relacionamento pastor-rebanho e acabaram culminando na dispensa. Em qualquer conflito ou crise é sempre sábio investigar o que poderia ter sido feito diferente ou qual a nossa participação na dinâmica da situação. É importante lembrar que nunca somos apenas passivos nesses casos, mas temos nossa contribuição no processo de desgaste da relação ministerial. Se não aprendemos com situações passadas, certamente repetiremos os erros no futuro.

Concluindo, pastores são dispensados e isso gera um desgaste emocional e espiritual tanto para o ministro como para o rebanho. Todavia, a maneira como o obreiro responde ao sentimento de rejeição envolvido nesse curso é influente e fundamental para o resultado disso sobre seu rebanho, família e o próprio coração. Ainda que árduo, o caminho do cultivo de algumas reações virtuosas certamente é o mais benéfico. Que o Senhor conceda graça e compreensão aos seus ministros para responderem à dispensa de maneira a glorificá-lo.

Rev. Valdeci S. Santos – SNAP

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