Templos Fechados e Igreja Aberta

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Com as notícias da propagação do coronavírus as autoridades governamentais têm tomado medidas cabíveis para evitar a aceleração ao pico na curva do contágio. A intenção por detrás dessas determinações é que se a curva for menos acentuada o sistema de saúde não será sobrecarregado e poderá atender melhor as vítimas da Covid-19. Nesse sentido, a população tem sido aconselhada a escapar das aglomerações e o distanciamento social se tornou uma nova norma. O isolamento é um “remédio amargo”, mas necessário nesses dias.

Colaborando para evitar grandes aglomerações, as escolas suspenderam as atividades presenciais ou anteciparam as férias dos alunos, as empresas optaram pelo trabalho de seus funcionários em home office e o comércio foi limitado às necessidades básicas. As atividades esportivas que atraíam grande número de expectadores foram canceladas e o calendário do futebol brasileiro sofreu alterações. Também, as igrejas tiveram que alterar a dinâmica de suas reuniões públicas, pois os templos foram fechados ao público maior. A adaptação a essa nova realidade tem sido muito difícil para todos, pois nossa geração e cultura nunca experimentaram algo semelhante.

O distanciamento social é penoso para todos, mas especialmente para os cristãos que são biblicamente exortados a se congregarem regularmente (cf. Hb 10.25). No entanto, os cristãos também são exortados a andarem prudentemente, “não como néscios, e sim como sábios, remindo o tempo, porque os dias são maus” (Ef 5.15-16). Nesses tempos de “dias maus”, especialmente considerando a velocidade da propagação do coronavírus, o isolamento social é necessário para proteção pessoal e preservação de vidas, inclusive de muitos da família cristã.

Mas o fato de haver templos fechados não significa que as igrejas estejam inativas. Na verdade, alguns templos estão fechados, mas os líderes das igrejas estão cada vez mais abertos à novas ideias em prol da edificação de seus membros. Diante do desafio de continuar cuidando das ovelhas, os pastores do rebanho buscam sabedoria, criatividade e o emprego de instrumentos adequados para o pastoreio à distância. A atenção pastoral não deve ser interrompida, mesmo num contexto de isolamento social.

É sabido que os pastores são responsáveis por equipar os santos com vistas ao “desempenho do seu serviço, para edificação do corpo de Cristo” (Ef 4.12). Mas como fazer isso quando as ovelhas se encontram dispersas, cada família em sua casa, impossibilitados de se locomoverem para, em culto público, receberem o alimento e a instrução? Certamente a tecnologia é uma ferramenta fundamental nesse sentido e as redes sociais podem ser empregadas de maneira positiva. No entanto, alguns cuidados práticos em relação ao cuidado pastoral devem ser tomados em qualquer contexto, inclusive no pastoreio à distância. Alguns desses cuidados são relacionados abaixo.

  1. Seja proativo. Diferente do que alguns pensam, esse não é um período para cruzar os braços e esperar o “tempo passar”. Alguns serão tentados a buscar um ambiente de refúgio, zelando apenas por si mesmos e sua família, aguardando somente que a tempestade se acalme. A pessoa proativa, porém, interpretará esses dias como uma “época repleta de oportunidades”. Por exemplo, o isolamento social obriga famílias a estarem mais unidas, o que pode contribuir para a redescoberta do culto doméstico, o estudo familiar das Escrituras e o uso outrora esquecido dos catecismos cristãos. Pastores podem apresentar orientações bíblicas e práticas sobre esses importantes exercícios a fim de que suas ovelhas continuem se alimentando da Palavra, mesmo quando impedidos de se reunirem regularmente. O pastor proativo se empenha por alcançar suas ovelhas, ainda que virtualmente.
  1. Seja criativo. Muitas igrejas que suspenderam suas atividades regulares recorreram à transmissão de mensagens online. Além do mais, alguns pequenos grupos podem continuar via reuniões virtuais. Inúmeros programas disponíveis na internet favorecem a realização desses encontros, o que faz com que o discipulado continue a ser praticado. Todavia, o que mais pode ser feito?

O contexto atual conclama líderes da igreja a usarem criatividade no pastoreio de suas ovelhas. Nesse sentido, algumas pessoas têm usado o Facebook para disponibilizar material que ajuda os pais na instrução bíblica de seus filhos, especialmente pelo fato de os filhos estarem em casa e terem tanto tempo livre. Outros pastores usam o Facebook para oferecerem devocionais diárias às suas ovelhas no momento do almoço, quando toda família pode ler a devocional reunida ao redor da mesa. Esses dias de intensa ansiedade requerem criatividade dos pastores, pois os crentes necessitam mais do encorajamento das Escrituras e precisamos ser criativos no cuidado com nossas ovelhas.

  1. Seja consistente. Antes de anunciar à igreja algum novo programa ou ideia, é melhor calcular os custos, pois a instabilidade pode ser danosa a qualquer expressão ministerial, real ou virtual. Logo, ao anunciar alguma nova medida é melhor ter certeza de que conseguirá levar a cabo o planejado, pois a inconsistência poderá desmotivar algumas pessoas. O melhor é começar com “poucas inovações”, mas ser consistente em cada atividade proposta.

A atitude consistente deve ocorrer não apenas em termos da frequência em relação à atividade proposta, mas também no tocante ao tempo da programação. Ou seja, se os membros da igreja tiverem a garantia de que a programação online terá sempre a mesma quantidade de tempo, será mais fácil para eles organizarem suas agendas a fim de participarem. Também, é necessário considerar a consistência em relação ao conteúdo. Ninguém gosta de parar suas atividades diárias apenas para um “bate-papo” sem propósito ou substância. Logo, esse aspecto também deve ser considerado.

  1. Seja relevante. Quanto mais tempo essa crise durar, o provável é que mais pessoas perderão empregos, ficarão ansiosas e amedrontadas ante a nova doença e confusas quanto ao que fazer. Além do mais, o isolamento pode ser interessante na primeira semana, mas terrivelmente angustiante com o passar do tempo. Nem todos os membros da igreja tomarão a iniciativa de procurar o pastor ou algum outro líder da igreja nesses momentos. Para evitar esse quadro de angústia, é necessário que a mensagem transmitida pela liderança da igreja sempre seja relevante e procure falar aos corações nesses tempos difíceis.

Nesse contexto, ser relevante talvez inclua a necessidade de uma conversa sobre a situação financeira de alguns, o relacionamento familiar de outros e assim por diante. Em outras palavras, cada interação deve ter o propósito de ministrar a alguém aquilo que, de fato, edificará a pessoa. Mais uma vez é importante lembrar as palavras de Paulo: “Não saia da vossa boca [nem dos dedos, na digitação] nenhuma palavra torpe, e sim unicamente a que for boa para edificação, conforme a necessidade, e, assim, transmita graça aos que ouvem” (Ef 4.29).

  1. Seja estratégico. Cada interação com os membros de sua igreja deve ser realizada “cirurgicamente”, ou seja, usando corretamente o tempo dedicado a isso. Nesse sentido, uma boa estratégia a ser seguida envolve:
  1. Procure saber como todos da família estão passando.
  2. Pergunte se a família possui alguma necessidade específica que a igreja possa ajudar.
  3. Apresente informações atualizadas sobre como a igreja tem enfrentado essa crise e quais membros necessitam mais de oração.
  4. Leia alguma passagem da Bíblia com a pessoa com quem você está interagindo.
  5. Dedique alguns minutos em oração uns pelos outros.
  6. Reafirme o amor e cuidado da liderança da igreja pelos seus membros, especialmente pela família da pessoa com a qual você está interagindo.

Quanto mais o tempo de isolamento e distanciamento social prolongar, tanto mais os líderes da igreja deverão cuidar para realizar esses contatos mais frequentemente. Como a situação ainda está confusa para todos, é importante rever algumas estratégias continuamente.

Enfim, pastorear virtualmente é algo novo e desafiador para todos os líderes da igreja. Isso nem parece, de fato, pastoreio, para alguns. Na situação que atravessamos, porém, essa é uma medida viável. Todos devemos ser sábios e aproveitar as oportunidades e ferramentas disponíveis no momento e, nesse contexto de isolamento social, as alternativas não nos deixam com muitas escolhas. O ideal é que em cada interação que tiver com suas ovelhas o pastor as exorte a orar, confiando na graça e provisão do Senhor Deus que nos sustenta.

Rev. Valdeci da Silva Santos – SNAP

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